Decisão histórica altera composição da Câmara e gera tensões políticas no Brasil

Na tarde desta quarta-feira, 30 de julho de 2025, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), assinou o Ato da Mesa nº 209, oficializando a perda de mandato de sete deputados federais. A medida foi tomada em cumprimento a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que alterou as regras de distribuição das chamadas “sobras eleitorais” nas eleições de 2022. Essa mudança, aplicada retroativamente, redefiniu a composição da Câmara e gerou uma onda de reações, desde protestos de parlamentares afetados até debates acalorados sobre a interferência do Judiciário no Legislativo.

O caso começou em março de 2025, quando o STF, por 6 votos a 5, decidiu que a regra anterior – que exigia que partidos alcançassem pelo menos 80% do quociente eleitoral e candidatos obtivessem 20% desse índice para disputar as sobras – era inconstitucional. A nova interpretação permite que todos os partidos e candidatos participem da redistribuição das vagas remanescentes, impactando diretamente os resultados de 2022. Essa retotalização dos votos foi determinada após ações movidas por legendas como PSB e Podemos, que questionaram a legislação eleitoral de 2021.

O estado mais afetado foi o Amapá, cuja bancada na Câmara, composta por oito deputados, perdeu metade de seus representantes. Os parlamentares cassados são Dr. Pupio (MDB-AP), Sonize Barbosa (PL-AP), Professora Goreth (PDT-AP) e Silvia Waiãpi (PL-AP). Outros estados também sentiram o impacto: Lebrão (União Brasil-RO), Lázaro Botelho (PP-TO) e Gilvan Máximo (Republicanos-DF) também tiveram seus mandatos revogados. Em seus lugares, assumirão Aline Gurgel (Republicanos-AP), Paulo Lemos (PSOL-AP), André Abdon (PP-AP), Professora Marcivania (PCdoB-AP), Tiago Dimas (Podemos-TO), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Rafael Fera (Podemos-RO), todos eleitos em 2022 sob o novo critério.

A decisão gerou controvérsia imediata. Gilvan Máximo, ex-deputado do Distrito Federal, anunciou uma greve de fome em frente ao Congresso, alegando que os parlamentares foram eleitos dentro das regras vigentes e que a cassação viola a Constituição, que prevê julgamento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em casos de perda de mandato. “Hugo Motta apequena o Parlamento com essa decisão. Fomos eleitos dentro da lei e não tivemos ampla defesa”, declarou Máximo, ecoando o sentimento de outros afetados que prometem recorrer à Justiça. Por outro lado, apoiadores da decisão, como o líder do PSB, Bira do Pindaré (MA), defendem que a medida corrige distorções e reflete melhor a vontade popular expressa nas urnas.

O processo técnico por trás da mudança envolve o quociente eleitoral, calculado dividindo-se o número de votos válidos pelo total de vagas por estado. As sobras eleitorais são as cadeiras que não são preenchidas na primeira distribuição e são redistribuídas numa segunda etapa. A antiga regra, segundo o STF, excluía partidos menores e candidatos com desempenho modesto, o que foi considerado uma barreira indevida. A retotalização, feita pelos tribunais regionais eleitorais, alterou a ordem de classificação, beneficiando legendas com votação mais pulverizada. Especialistas apontam que isso pode aumentar a diversidade política, mas também levanta preocupações sobre a estabilidade das eleições passadas.

Hugo Motta, ao anunciar a decisão, reforçou que a Câmara apenas cumpriu uma ordem judicial, sem espaço para manobra. “A determinação do STF foi clara e seguimos o rito regimental”, afirmou, destacando que a Casa não tem poder de revisão sobre decisões judiciais. Contudo, a medida expõe uma tensão crescente entre os poderes. Nos últimos meses, Motta já havia enfrentado pressões de deputados bolsonaristas e governistas em outros casos, como a cassação de Carla Zambelli e as sanções dos EUA a Alexandre de Moraes, o que torna esse episódio mais um capítulo numa relação fragilizada.

O impacto político é significativo. No Amapá, a perda de quatro mandatos altera o equilíbrio entre as bancadas locais, potencialmente mudando a dinâmica de apoio a projetos federais. Em escala nacional, a decisão pode influenciar as negociações para 2026, com partidos buscando se adaptar às novas regras. Além disso, a possibilidade de novos recursos ao TSE ou até ao STF mantém o caso em aberto, com desdobramentos esperados nas próximas semanas.

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Para os eleitores, o episódio levanta questões sobre a autonomia do Legislativo e os limites da atuação do Judiciário. Enquanto alguns veem a decisão como um avanço democrático, outros a consideram uma interferência indevida. O debate deve continuar aquecido, especialmente com as eleições municipais de 2024 como pano de fundo, onde as novas regras já foram aplicadas.