Ministro da Fazenda defende soberania brasileira em negociação sobre tarifas

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A tensão comercial entre Brasil e Estados Unidos ganhou um novo capítulo nesta terça-feira, 29 de julho de 2025, com declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que sinalizou a possibilidade de uma conversa direta entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente americano Donald Trump. Faltando apenas três dias para a entrada em vigor de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, impostas por Trump desde 9 de julho, Haddad deixou claro: o diálogo, se ocorrer, não será marcado por subserviência ou o chamado “vira-latismo” — um termo que remete ao complexo de inferioridade histórico do Brasil diante de potências estrangeiras. Em entrevista a jornalistas em Brasília, o ministro defendeu uma negociação equilibrada, com preparação diplomática prévia, refletindo a postura de um país soberano. Mas o que está por trás dessa postura, e como ela pode moldar o futuro das relações bilaterais? Vamos analisar os detalhes desse momento decisivo.

A declaração de Haddad surge em um contexto de crise. As tarifas, anunciadas por Trump como uma resposta a supostos ataques do Brasil à liberdade de expressão e à perseguição judicial contra Jair Bolsonaro, estão a poucos dias de entrar em vigor, em 1º de agosto. O governo brasileiro, por sua vez, vê a medida como uma retaliação política, especialmente após críticas de Trump ao julgamento de Bolsonaro por tentativa de golpe no Supremo Tribunal Federal (STF). Haddad, ao falar sobre a possibilidade de uma ligação entre Lula e Trump, enfatizou a necessidade de “azeitar os canais” antes de qualquer contato direto. “Quando dois chefes de Estado conversam, há uma preparação protocolar mínima. Não é correr atrás, mas sentar à mesa como iguais, sem sentimento de subordinação”, afirmou o ministro, rejeitando qualquer narrativa de inferioridade.

A menção ao “vira-latismo” ressoa como uma crítica velada às gestões anteriores, especialmente a de Bolsonaro, a quem Haddad alfinetou indiretamente. “Tivemos um presidente que agiu de forma subserviente, o que não condiz com a estatura do Brasil. Vamos virar essa página”, disse, sugerindo que o alinhamento automático com os EUA no passado enfraqueceu a posição brasileira. Essa postura reflete a estratégia de Lula de posicionar o Brasil como líder do Sul Global, buscando parcerias equilibradas e rejeitando imposições unilaterais. A preparação diplomática, segundo Haddad, envolve conversas entre ministros e autoridades, como o vice-presidente Geraldo Alckmin, que lidera um comitê para negociar com os americanos, e o chanceler Mauro Vieira, que sinalizou disponibilidade para viajar a Washington.

O cenário atual é complexo. Apesar dos esforços brasileiros, incluindo uma carta confidencial enviada em maio e reuniões desde março, os EUA permanecem em silêncio oficial. Senadores brasileiros que viajaram a Washington no fim de semana voltaram sem compromissos concretos com a Casa Branca, o que alimenta o pessimismo em Brasília. Haddad, no entanto, mantém a esperança de que um diálogo direto possa reverter ou adiar o “tarifaço”. “Se houver negociação, será com respeito mútuo. Não aceitamos chantagem”, declarou, reforçando que o foco será exclusivamente comercial, sem misturar questões judiciais internas, como o caso Bolsonaro, que Trump insiste em trazer à tona.

O impacto econômico das tarifas é inegável. Setores como o de carnes, café e manufaturados, que respondem por grande parte das exportações ao mercado americano (cerca de US$ 80 bilhões anuais), podem perder competitividade. Haddad revelou que o governo tem planos de contingência, incluindo medidas para proteger empregos sem novos gastos públicos, mas evitou detalhes. Analistas apontam que o Brasil poderia redirecionar parte das exportações a outros mercados, como China e União Europeia, embora isso demande tempo. A balança comercial, que mostra um superávit de US$ 200 milhões a favor dos EUA, contradiz a narrativa de Trump sobre “déficits insustentáveis”, um argumento que Lula já rebateu publicamente.

A relação entre Lula e Trump, marcada por divergências ideológicas, complica o quadro. Trump, reeleito em 2024, adota uma linha protecionista e usa as tarifas como ferramenta política, enquanto Lula busca fortalecer o Brics e a multipolaridade. Haddad sugeriu que a imprevisibilidade de Trump, vista em conversas com líderes como Volodymyr Zelensky, exige cautela. “Não podemos improvisar. O diálogo precisa ser edificante, valorizando os dois povos”, afirmou. Essa visão é compartilhada por diplomatas, que temem que um telefonema sem preparação prévia resulte em constrangimentos, como os já experimentados por outros líderes.

Enquanto isso, o governo Lula mobiliza esforços. Alckmin coordena negociações técnicas, e o Conselhão, marcado para 5 de agosto, deve discutir os impactos do tarifaço. Governadores do Nordeste preparam um mapeamento detalhado das perdas por estado, pressionando por soluções. Na esfera internacional, o Brasil ameaça recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC), enquanto estuda a Lei de Reciprocidade para retaliar. Haddad, no entanto, aposta na diplomacia. “Somos bons negociadores. Se Trump quiser conversar, estaremos prontos”, disse, ecoando a confiança de Lula em eventos recentes.

A sociedade brasileira acompanha o desenrolar com apreensão. Nas redes sociais, o tema divide opiniões, com alguns defendendo a soberania e outros criticando a falta de ação mais enérgica. A data de 1º de agosto se aproxima como um teste para a capacidade do governo de proteger os interesses nacionais. Para Haddad, o sucesso dependerá de um diálogo que supere o “vira-latismo” e afirme o Brasil como parceiro, não subordinado. Resta saber se Trump, conhecido por sua postura rígida, abrirá espaço para essa conversa — ou se o Brasil terá de buscar alternativas para enfrentar a tempestade comercial que se avizinha.